São Paulo, Rio Grande do Sul e Minas Gerais lideram judicialização da medicina no Brasil

São Paulo, Rio Grande do Sul e Minas Gerais lideram judicialização da medicina no Brasil

Advogado especialista em erro médico esclarece porquês da incidência

A judicialização da Saúde e da Medicina segue em trajetória ascendente no Brasil e é majoritária em três estados: São Paulo, Rio Grande do Sul e Minas Gerais. É o que revela uma pesquisa concluída em 2024, elaborada pelo Conselho Federal de Medicina (CFM) em parceria com outras instituições, entre elas o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que analisou o panorama nacional das ações judiciais envolvendo médicos, serviços de saúde e o poder público.

O levantamento aponta que o número de processos relacionados à área da Saúde já se aproxima do total de médicos em atividade no país, o que evidencia um cenário de crescente tensão entre pacientes, profissionais, instituições hospitalares, planos de saúde e o Estado. A maior parte dessas ações tramita na Justiça Estadual, responsável por mais de quatro quintos dos processos, enquanto a Justiça Federal concentra uma parcela menor, porém relevante.

Para o advogado Thayan Fernando Ferreira, especialista em direito de saúde e direito público, membro da Comissão de Direito Médico da OAB-MG e diretor do escritório Ferreira Cruz Advogados, o fenômeno está diretamente ligado à forma como o direito à saúde é assegurado na Constituição Federal. “A judicialização da saúde no Brasil é, antes de tudo, um reflexo do artigo 196 da Constituição, que estabelece a saúde como direito de todos e dever do Estado. Quando esse dever não é plenamente cumprido, o Judiciário passa a ser visto como o caminho mais rápido e, muitas vezes o único, para garantir tratamentos, medicamentos e procedimentos”, explica.

De volta a pesquisa, entre os estados, São Paulo aparece na liderança absoluta em volume de processos, seguido por Rio Grande do Sul e Minas Gerais. Juntos, os três concentram uma fatia significativa das ações judiciais relacionadas à prática médica e ao acesso à saúde no país. O Rio Grande do Sul, embora tenha população menor que São Paulo, chama atenção por apresentar uma das maiores taxas proporcionais de processos por habitante e por médico, o que indica maior litigiosidade no setor.

Na sequência do ranking aparecem Rio de Janeiro e Bahia, que também registram números expressivos, mas em patamar inferior aos três primeiros colocados. As regiões Sul e Sudeste lideram os índices nacionais de judicialização, enquanto Norte e Nordeste apresentam taxas proporcionalmente mais baixas.

Outro dado relevante é o perfil dos réus. Em boa parte das ações, não figuram apenas médicos individualmente, mas também hospitais, clínicas, planos de saúde e o próprio poder público, o que reforça o caráter estrutural da judicialização.

“Grande parte dos processos não decorre exclusivamente de erro médico, mas de problemas estruturais, como falta de acesso, demora no atendimento, ausência de leitos ou negativa de cobertura por planos de saúde. O médico, muitas vezes, acaba no centro do litígio por integrar a ponta mais visível do sistema”, sustenta Thayan.

O estudo também mostra que os índices de condenação variam de estado para estado, com percentuais que chegam a cerca da metade dos processos em algumas unidades da federação. Esse cenário, de acordo com especialistas, têm impacto direto na prática médica, estimulando a chamada medicina defensiva, em que profissionais solicitam exames e procedimentos adicionais como forma de se resguardar juridicamente.

Contudo, para Thayan, o desafio é encontrar equilíbrio entre a proteção ao paciente e a segurança jurídica dos profissionais de saúde. “É fundamental fortalecer políticas públicas, aprimorar a gestão do SUS e estabelecer critérios mais claros para a responsabilização médica. Judicializar tudo não resolve a raiz do problema e ainda sobrecarrega o Judiciário”, finaliza.

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